Primeiramente, antes de analisar o resultado da Grendene, vamos dar uma olhada na indústria calçadista para saber como está o setor.
Análise Setorial
Segundo dados da Associação Brasileira das Indústrias de
Calçados – ABICALÇADOS, em 2014 a produção foi de 996 milhões de pares. Entre
2015 e 2016, o setor perdeu posições no mercado interno e externo. Os problemas,
como o alto custo de produção, agravados por uma crise econômica que levou os
índices de desemprego e inadimplência às alturas, fizeram com que a produção de
calçados caísse mais de 8%.
Em 2017, a produção foi de 942,8 milhões de pares e em 2018,
a produção cresceu apenas 0,1%, totalizando 944 milhões de pares. A
performance negativa de 2018 teve influência do fraco desempenho no mercado
doméstico, mas, também, teve grande contribuição da queda de 10% nas
exportações ante 2017 e, menos da metade do faturado há dez anos.
Para 2019, a partir da recuperação, especialmente das
exportações, projeta-se um crescimento entre 1% e 3%, o que, no entanto, não
será suficiente para voltar aos patamares pré-crise.
A estabilidade da produção brasileira contrastou com o incremento da produção mundial de calçados, que fechou 2018 somando 22,3 bilhões de pares, quase 3,5% mais do que no ano anterior. O Brasil permanece na quarta posição entre os produtores mundiais, atrás de China, Índia e Vietnã, e seguido de perto pela Indonésia. O que tem mantido essa alta produção brasileira, hoje a maior do Ocidente, tem sido o mercado interno, que, no entanto, vem desaquecendo nos anos recentes.
Quanto à exportação mundial, o Brasil responde apenas pela 11ª posição, com 113 milhões de pares exportados ao longo de 2018, atrás de países não tradicionais na produção do setor, como Países Baixos e Reino Unido. “O Brasil é pouco competitivo no cenário internacional”, comenta a coordenadora de Inteligência de Mercado da Abicalçados, Priscila Linck.
Para o doutor em Economia Marcos Lélis, o problema é mais estrutural do que conjuntural. O economista ressaltou que, apesar das expectativas positivas geradas pelo novo governo, a economia ainda não reagiu de forma efetiva, com índices de desemprego e inadimplência elevados. "Os investimentos, tanto públicos quanto privados, estão nos mesmos patamares de 2008 e 2009”, disse, acrescentando que a baixa utilização da capacidade instalada do setor – de cerca de 75% – não permite outro cenário.
Finalmente, para o presidente-executivo da Abicalçados, Haroldo Ferreira, o setor encolheu especialmente por culpa da conjuntura econômica nacional e internacional dos últimos anos. Hoje, temos uma capacidade produtiva muito maior do que de consumo. O grande entrave é justamente a demanda desaquecida em função dos índices de desemprego e inadimplência. Na questão internacional, temos um problema grave de competitividade relacionado ao Custo Brasil, obstáculo que temos esperança de que o governo atual resolva, em boa parte, ainda nesses quatro anos.
Fonte dos dados:
Análise Grendene
A Grendene divulgou os resultados do primeiro trimestre de
2019 e logo na primeira página do relatório constam os destaques do 1T19 vs.
1T18:
- Queda 22,5% na receita líquida.
- Lucro líquido de R$76,5 milhões – 51,0% menor.
- Ebit de R$33,5 milhões – 72,2% menor.
- Queda em todas as margens.
- Volume de pares – 28,5 milhões – 29,5% menor.
Como o resultado do trimestre foi horroroso, decidi dar uma
olhada no histórico da empresa conforme dados disponíveis no site de RI.
Analisando os dados no período de 2013 a 2018, nota-se que a
receita líquida da empresa ficou praticamente estável, enquanto que o volume de
pares diminuiu em 25%. Logo, para manter o mesmo nível de receita vendendo menos
pares, houve aumento de 33% na receita líquida por par, passando de R$ 10,12
para R$ 13,49.
Em 2017, o lucro líquido da Grendene passou de R$ 661
milhões para R$ 586 milhões em 2018, apresentando uma queda de 11%. Esta queda foi
influenciada principalmente por causa do resultado financeiro 33% menor em 2018,
já que o resultado operacional reduziu apenas 2% no mesmo período. Como a
empresa encerrou 2018 com R$ 1,5 bilhão de dinheiro em caixa, o resultado
financeiro tem um peso importante na apuração do lucro líquido.
Analisando a margem líquida, que mostra quantos por cento da
receita líquida efetivamente se transforma em lucro líquido, temos que desde
2016 está caindo, passando de 31% para 23% no 1T2019. Já o ROE, que mede em
porcentagem a capacidade de uma empresa em gerar lucros a partir de seu
patrimônio líquido, temos uma estagnação no período de 2012 a 2016 e desde
então uma queda de 31% até o 1T2019.
Percebe-se claramente que a Grendene vem perdendo eficiência
a partir de 2016, mas ao mesmo tempo precisamos ter em mente que a indústria de
calçados no Brasil passa por um momento de estagnação, tendo em vista que a
produção de calçados estimada em um cenário otimista para o corrente ano é de 976
milhões de pares, sendo esta abaixo da produção ocorrida em 2014, quando foram
produzidos 996 milhões de pares.
Como a indústria de calçados no Brasil é extremamente
dependente do mercado interno, já que praticamente 91% da produção fica no país,
faz-se necessário que a economia volte a crescer ou que haja políticas públicas
para tornar o calçado brasileiro competitivo internacionalmente, o que ajudaria
as empresas do setor a diminuir a capacidade ociosa que em 2018 foi de 24%.
Enquanto isso, no relatório do 1T2019, a Grendene afirma que
perdeu market share e que não acredita em recuperação de consumo de calçados no
mercado brasileiro para este ano, permanecendo completamente indefinido como a
economia, o consumo e o consumidor devem se comportar. A tão esperada
recuperação ainda não começou e pode nem acontecer este ano.
A Grendene jogou a toalha para 2019, mas a empresa precisa
se mexer, pois a estratégia de aumentar o preço dos calçados para compensar a
queda nas vendas já não tem mais surtido efeito e o lucro líquido da empresa
está em queda.
Você sabia...?
Que em 2018, a produção de chinelos representou 46,8% dos pares produzidos no Brasil.
That’s all folks.